Parlamentares avaliam risco eleitoral da reforma da Previdência

(foto: PABLO VALADARES/CÂMARA DOS DEPUTADOS)

As indicações para a composição da comissão especial da reforma da Previdência foram minuciosas. Se a oposição vai para o tudo ou nada, confiante de que o argumento contra os beneficia, a nomeação dos partidos de centro foi mais meticulosa. Afinal, a experiência mais recente da votação do texto no colegiado especial mostra que o voto favorável às mudanças nas regras de aposentadoria tira, em média, 31,3% de votos. Os líderes de partidos fizeram as contas e foram comedidos sobre quem indicar, sabendo que o desgaste com a matéria pode custar apoios. O presidente da comissão especial, Marcelo Ramos (PR-AM), se reúne com lideranças partidárias amanhã para definir o calendário para os trabalhos. O colegiado terá a primeira reunião ordinária em 7 de maio.

Quando a reforma proposta pelo governo Temer tramitou na comissão especial, o relatório foi aprovado com 23 votos favoráveis. Desses, cinco deputados não concorreram à reeleição e um disputou o Senado, Ricardo Trípoli (PSDB-SP), que não conseguiu novo mandato. Os outros 17 somaram 1,08 milhão nas últimas eleições. Em 2014, juntos, atingiram 1,57 milhão. Desses 17, mesmo os cinco reeleitos obtiveram, juntos, menos votos: 443 mil. Nas eleições de 2014, somaram 469,1 mil, o que representa redução de 5%. A realidade foi ainda mais dura para os que não conseguiram votos para a reeleição. Em 2014, somaram 1,10 milhão. Em 2018, 638,8 mil — tombo de 42,2%. São contas que lideranças fizeram antes de ir para a nova etapa da guerra da Previdência.

É fato que o voto a favor da reforma, dado em 3 de maio de 2017, não foi o único fator para o insucesso na reeleição. A votação perto de fim de mandato deixou recordação mais fresca na memória dos eleitores. Mas o impacto das redes sociais para expor os parlamentares favoráveis ao texto, somado ao pretenso alinhamento deles a Temer — denunciado duas vezes pela Procuradoria-Geral da República — potencializou as derrotas em um clima eleitoral de antipolítica.

Mas votar pela modernização da Previdência, com a oposição expondo e atacando quem é a favor, não é algo que ajuda, principalmente quando parte da estratégia dos partidos contrários ao texto prometem estampar os rostos dos favoráveis em suas bases eleitorais. “Toda reforma que mexe com direitos o parlamentar pensa duas vezes antes de encarar, porque o desgaste é grande”, pondera o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO).

O discurso econômico, de que os parlamentares poderão ser bonificados com a retomada da economia ao se comprometer com a aprovação da matéria, não convence a todos os congressistas no curto prazo. “Herói bom é herói vivo, não morto”, adverte Nelto. O parlamentar avalia que o governo deve pensar politicamente e ser solidário à base, não solitário. “O governo está em um jogo. Se não tivermos cuidado, ele sai como herói e, nós, saímos como vilões”, acrescenta.

A vaga do Podemos na comissão especial será composta pelo deputado Léo Moraes (GO). A participação dele no colegiado foi amplamente discutida na bancada, uma vez que a noção dos riscos foi alvo de conversas internas. Missão semelhante será conduzida pelo deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), representante do partido no colegiado. “Se meu voto custar o mandato, que custe, mas não estarei lá buscando a reeleição. Vou trabalhar pela retomada da economia”, destaca.

AFAGOS  Os parlamentares dispostos a votar a favor da reforma vão encarar a oposição na mesma moeda. “São eles que estão enganando a população. A oposição vai bater e mentir, mas não terei medo de assumir posição. Se não votarmos agora, estaremos apenas adiando o inevitável. Sem a modernização da Previdência, os investimentos vão sumir e vai faltar emprego para os chefes de família colocarem pão e comida na mesa”, sustenta Martins.

A tramitação na comissão especial reforça a necessidade por cobranças a alterações na articulação política. Partidos vão cobrar garantias a curto prazo de que serão bem recompensados com o “sim” à proposta. A pressão é por espaços em superintendências e autarquias do governo federal nos estados, mediante indicações políticas nesses órgãos. A liberação de emendas parlamentares — que o governo é obrigado a executar — é outro pedido.

O governo não tem para onde fugir. Ou faz afagos aos parlamentares ou sucumbe, alerta o cientista político Enrico Ribeiro, consultor da Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais. Para ele, a ação inicial do governo deve ser voltada para dividir o ônus, ou seja, começar a defender abertamente a reforma da Previdência e garantir que ela é importante ao país. É algo que o governo não vinha fazendo e, agora, o presidente Jair Bolsonaro tenta fazer. “O resto é afagar os parlamentares. Não vejo outra solução pacífica além de negociar, republicanamente, cargos e troca de emendas. É o que pode diminuir o desgaste político”, avalia.